Por: João Veras
TESTEMUNHO ACREANO
Eu hoje vi uma mulher
indígena pedindo esmola.
Ela estava sentada no chão
da calçada suja com uma criança ao colo
que procurava se alimentar
em seu peito.
Era no centro da cidade,
próxima à escola infantil Menino Jesus.
Ali todos passam, olham para
baixo e passam.
O que eu vi hoje, vi
ontem...
Hoje eu vi vários indígenas
pintados em alerta e em movimento.
Eles estavam para a guerra
na defesa da sobrevivência.
Eles reclamam dos péssimos
serviços de saúde prestados pela burocracia do Estado.
Serviços esses que não
conseguem impedir que várias crianças indígenas morram de diarreia nas aldeias.
o que vi hoje, vi ontem...
Hoje eu vi alguns indígenas
com as suas penas fabulosas e vestes idem.
Esses participavam de um
evento público promovido pelas autoridades governamentais.
Eles estavam para a festa.
Eles compunham o quadro da
participação do índio em um governo democrático.
o que vi hoje, vi ontem...
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OS ISOLADOS DO ACRE
Todos acham bela a foto
de homens apavorados.
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O PESAR INDÍGENA, A PELÍCULA
Eu assisti um tirar o jeans
e se pintar.
Então se reenfeitou manso,
se reexotizou bravo
e shopinizou a aldeia com
créditos de liquidação transcendental.
Em fila bem educada,
consumidores brancos se divertiam.
Numa mão um ingresso
comestível à prova de imitação e na outra
o menu dos produtos de
carbono sustentáveis e suas miçangas coloridas.
Chuveiro quente,
hospitalidade da melhor e miração a três dólares a hora e meia.
De amostra grátis, uma
selfie com um bebê mamando, quatro meninas de seios nus sorrindo, uns trinta
guerreiros jovens mais dois pajés anciãos sentados a fumar.
O diretor filmava tudo em
plano sequência.
Alucinado gritava: very
beautiful, txai!
A cena enquadrava os
visitantes modernos com as suas cartas baixadas na rede.
Ao fundo, vitrines, umas
mil.
Tudo parecia remeter à
plantação no sul do velho mundo de 1500.
Tudo parecia hoje em
invisível, como é.
Daí, vi a fumaça da paz
queimando em câmera lenta a floresta.
Não ficou um.
E quando acordou,
esse um vestia paletó cinza
com gravata vermelha,
trazia um punhado de votos
no bolso da direita e uma ideia fixa na cabeça:
sonhava esplêndido tal qual
um candidato à descoberta do Brasil.
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LIÇÃO DE CASA
“Hoje é o dia do índio no
Brasil”
Que hoje
Que dia
Que índio
Que Brasil
Que
João Veras é advogado, escritor, poeta, músico e participa ativamente do ambiente artístico e social acreano. Recentemente defendeu sua tese de doutorado em Ciências Humanas, pela Universidade Federal de Santa Catarina, sob o título "SERINGALIDADE: A Colonialidade no Acre e os Condenados da Floresta".
Os poemas aqui publicados foram gentilmente cedidos pelo mesmo. Quem quiser conhecer mais seus poemas indico que acesso à sua página no Facebook: https://www.facebook.com/joaoveraspoemas/
Imagens:
1. Indígena Jaminawa pedindo esmola no centro da cidade de Rio Branco - Fonte: G1 Acre
2. Índios isolados. Fonte: Gleilson Miranda, SECOM-Acre
3. Foto: Tashka Yawanawá
4. Foto: Sérgio Carvalho
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