Homenagem à jornalista Laura Rachid
Por: Antônio Macêdo
Hoje
me dirijo aos meus leitores com o mesmo amor e carinho que sempre chego às
muitas aldeias e seringais do Acre, do Sudoeste do Amazonas e Noroeste de
Rondônia.
Assim
como também cheguei aos diversos lugares do Brasil, como Cuiabá-MT,
Brasília-DF, São Paulo-SP, Rio de Janeiro-RJ e até fora do país, como Estados
Unidos, França, Inglaterra, México, Noruega e outros cantos do mundo que já
andei a trabalho do desenvolvimento dos povos da floresta.
Hoje,
venho falar de mais uma dessas lindas viagens feitas na floresta do meu estado
do Acre, com o intuito claro de homenagear uma pessoa querida.
Laura
Rachid, uma amiga jornalista maravilhosa de 24 anos que realizou sua primeira experiência
nas aldeias indígenas do Acre. Visitou os povos Huni Kuin do Alto Tarauacá, Rio
Jordão e Rio Breu, passou pelo povo Apolimas-Arara para chegar à aldeia
Ashaninka do Rio Amônia, dormiu em aldeia Ashaninka do Rio Breu e conheceu os
Kuntanawa do Rio Tejo. Tudo isso em minha companhia por 52 dias, na recente
viagem que tive o privilégio de realizar.
Toda
viagem é um caminho de descobertas de outros horizontes, e de novos caminhares.
É buscar superar cansaços da estrada trilhada, é superar dúvidas e dificuldades,
é abrir novas descobertas. O que ocorrem nos caminhos dos mistérios de cada
tempo e em cada lugar.
A
viagem é mais um meio de encontrar, conceber e conhecer tudo que deixamos para
trás. É o caminho pra reviver, lembrar para ter saudade e rememorar o que já
viveu. Para conversar, para tirar dúvidas e confirmar muitos pensamentos seus.
É
a cantoria da música. É a voz do povo, a dança dos terreiros dos Shubuãs. É o
discernimento da espiritualidade. É o novo dia, o amanhã.
Essa
viagem foi nos jardins do grande Mestre, sempre com muito astral, com amor e
com alegria, com firmeza. Com certeza, fizemos essa viagem junto à Deus, por
isso mesmo, não esqueceremos jamais.
Neste
singelo texto apresento a memória fiel relativa à viagem, e os intercâmbios
contagiantes, que participamos com os povos indígenas Huni Kuin, Kutanawa e
Ashaninka, dos rios já citados acima, e, ainda, os bons encontros que tivemos
com vários moradores não-indígenas das Reservas Extrativistas -RESEX Alto Juruá
e Alto Tarauacá. Foi uma epopeia linda, regada a flores e muita alegria.
Nossa
caminhada se iniciou no meio do mês de maio e terminou no meio de julho deste
ano. Aliás, se nos perguntarem se a viagem acabou mesmo, para nós acho que
ainda não, afinal, toda hora estamos ligados às histórias que vivemos,
continuando a fazer alguma coisa para fortalecer os povos indígenas.
Para
mim, essas viagens tinham como objetivo oculto fazer minha terapia
pós-transplantes. E assim cheguei de canoa a muitas aldeias, caminhei nos
varadouros que interligam um rio ao outro rio - ou uma aldeia a outra aldeia -
e nesse sentido tudo isso foi fantástico.
Como
já falei, nessa aventura contava com a maravilhosa companhia da jornalista Laura
Rachid que ajudava em tudo e estava sempre pronta, com a câmera na mão
documentando tudo que nos foi permitido documentar. Ela fazia acontecer
milagres na viagem e nada passava impune na frente da câmera dela.
O
fantástico de tudo isso foram os diversos momentos que vivemos com as
comunidades indígenas. As conversas, as trocas de experiências e ainda as
diversas reivindicações colocadas pelos indígenas permanecem vivas dentro de
nós até hoje, seja na memória, sejam nos projetos construídos depois.
Entre
as reivindicações estão: desenvolvimento e manutenção das artes indígenas;
construções de açudes; aquisição de barcos para escoamento de produções
agrícola e artesanal; comunicação (rádio, orelhão, Internet); necessidades de
saneamento d’água, esgotos e energia; organização
objetiva do lixo que vem de fora das aldeias, e mela os pátios, as águas dos rios
e das fontes, entre outras.
Todos
os trabalhos foram muito importantes, a cada passo nos apontavam situações e a
cada reivindicação surgia um compromisso entre nós e os indígenas. As demandas
feitas estão devagar, mas, esperamos concretizar essas demandas que buscam
apenas melhoria de vida e fortalecimento da cultura.
Um
evento sublime que participamos foi a 25ª Festa de Comemoração da Demarcação da
Terra Indígena Kampa do Rio Amônia, onde vive o Povo Ashaninka. Antes mesmo da
caiçumada, que daria início às festividades, tivemos duas noitadas lindas de
Kãmarãpy (como os Ashaninka denominam a ayahuasca) no terreiro da aldeia
Apiwtxa. Momento inesquecível, que se somou a outros doze rituais que
participamos junto aos outros Povos que visitamos.
Das
nossas relações feitas com as comunidades indígenas tudo foi lindo e
maravilhoso, mas, o que mais me chamou a atenção dentro daquele bom relacionamento
que tivemos, foram as crianças das aldeias. Elas se grudavam em nós e a Laura
era o centro das atenções das crianças, que logo gostaram muito dela. Para
roubar a meninada da aba da saia da Laura eu precisava pegar um violão e, ai
sim, as crianças vinham tocar comigo ou ficar à minha volta. Uma batia bumbo,
enquanto outra chacoalhava um maracá. No final, tudo ficava certinho entre
todos nós. Nas noites de rituais essas crianças estavam ali nos rodeando, cantando
e dançando com total liberdade e alegria. Foram momentos muito fortes.
Laurinha
soube conduzir uma boa diplomacia não somente comigo, mas também , e de muito
bom jeito, com os povos indígenas- adultos e crianças. Relacionou-se
maravilhosamente bem com os regionais como um todo, com as autoridades e
técnicos que encontramos no caminho, trabalhando com os povos indígenas.
Encontramos professores, pesquisadores e outros maravilhosos visitantes que,
assim como nós, visitavam os povos indígenas da região.
Por
todos estes pontos fortes descritos acima, por tudo que você inspira ao te ver
trabalhando nas aldeias, finalizando, Laurinha querida: você continua sendo
muito importante para todos nós que cruzamos o caminho com o seu e até para
quem você não chegou ainda a conhecer aqui. Digo isso não só para a
continuidade dos trabalhos que já estamos realizando juntos, mas, sobretudo,
para a continuidade cada vez mais organizada das ações provenientes deste
primeiro contato feito na região.
Antônio Batista de
Macêdo, o Txai Macêdo, é sertanista da FUNAI e uma figura importantíssima para
o indigenismo e para os povos indígenas no Acre. Juntamente figuras como com
Txai Terri, Dedê Maia foi (e continua sendo) uma memória viva do que foram os anos
de luta, desafios, vitórias, alegrias e tristezas em prol das questões
indígenas nesse rincão da Amazônia. Vivas a esse grande txai, cuja história
merece ser contada e recontada por quem
admira e conhece o seu trabalho. (Jairo Lima)
Imagens, todas são paret do acervo de viagem do Txai Macêdo: Imagem 1 - Despedida da aldeia São Joaquim, TI Kaxinawá do Rio Jordão; Imagem 2 - Casa do Mateus filho do saudoso Agustinho, TI Kaxinawá do Rio jordão; Imagem 3 - Mobilização pra reunião, TI Kaxinawá/Ashaninka do Rio Breu; Imagem 4 - Laura (esq.) devidamente trajada e preparada para a festa Ashaninka; Imagem 5 - Laura Rachid.
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