segunda-feira, 27 de junho de 2016

NO RASTRO DA SERPENTE: Reordenamento econômico e a luta dos povos tradicionais

uma serpente rasteja por toda a América. Há muito a enrodilha em seu abraço. E não é a Jiboia Yube, na língua Hãtxa Kuin “língua verdadeira” dos Huni Kuin, não, ela não esteve nas águas profundas com kenewma e kenewsi, não emplumou seu ser com Quetzalcóalt, nem irmanou estrelas na amplidão pampeana como as rubras chamas de boitatá.
Esta Serpente não é daqui, vem de além, de outras lonjuras. Chegou nestas paragens quando era a terra sem amo, sem América, imensa, rica e vegetal.”
O texto acima é parte da introdução de um interessante livro que estive lendo estes dias em que a falta de ar, fantasma que me assombra todos os anos nesta época, voltou para lembrar-me o quão ligado meu organismo está em relação ao clima amazônico.
Sempre acreditei que cada livro ou texto que lemos nos acrescenta algo, como uma espécie de “milhagem” de conhecimentos e conteúdos, que associados a outras fontes de informação e aprendizagem durante nossa vida, nos possibilitam uma leitura de contexto e de realidade mais completa e ampla, nos colocando em perspectiva.


segunda-feira, 20 de junho de 2016

EVANGELIZAÇÃO DE ÍNDIOS: A dialética do sagrado no Juruá

"Miração Yawanawá" - desenho Hushahu Yawanawá
Vivemos tempos confusos. As divergências de uns poucos tentam apartar os corações e findar amizades de muitos, dando-nos a sensação de que vivemos a ditadura de um maniqueísmo ultrapassado que está dividindo e transformando a sociedade numa caricatura atualizada e pândega da disputa entre guelfos e gibelinos.
Com as lentes, mentes e corações direcionados ao Planalto Central pouca atenção sobra para a periferia nacional onde minorias lutam e morrem a cada dia. É impressionante a indiferença com que a imprensa e as autoridades políticas tratam as notícias de conflitos entre índios e fazendeiros por um naco de terra enquanto as redes sociais, programas de TV e jornais se regozijam e alardeiam as imagens de pseudo-celebridades que “quase mostraram demais” durante suas férias em Ibiza ou em Búzios.

segunda-feira, 13 de junho de 2016

EPOPEIAS NO ACRE INDÍGENA: De Euclides da Cunha ao Txai Terri Aquino

Tipo de embarcação muito utilizada no Juruá no início do século XX
No Aquiry, o banzeiro provocado nas tribulações de Brasília anda toldando as relações políticas indigenistas e indígenas, nos assustando com cenas bizarras, discussões fúteis e muita arenga, disponibilizadas e compartilhadas neste palco mundial, que por vezes põe em foco o que deveria estar na obscuridade: facebook.
Aqui no Juruá também chegam burburinhos confusos da capital, que nos trazem informações sobre reuniões e pelejas acerca do planejamento de certo evento que irá ocorrer nos próximos meses e sobre o qual não darei nenhum destaque. Decisão esta motivada por considerações pessoais que certamente enfadariam os poucos leitores deste blog. Assim, enveredo mais uma vez por questões que para mim são mais agradáveis e que certamente farão melhor à saúde mental dos que seguirem comigo.

segunda-feira, 6 de junho de 2016

IBÃ HUNI KUĩ: CIPÓ, CANTO E ARTE QUE VIERAM DO YURAIÁ

Prof Ibã na exposição
"Sounds of Ligth", em Paris 
Olhei para o céu. As estrelas brilhavam numa intensidade que para mim era ofuscante. O cricrilar reverberava em diferentes tonalidades facilmente perceptíveis para meus ouvidos de músico. A noite estava fria, mais fria que o normal para aquela época do ano, mas a brisa trazia um aroma de almíscar que parecia emanar da floresta ao redor. Um barulho me chamou a atenção e, quando olhei, nada mais era que um sapo cururu me encarando indiferente a partir do chão úmido e cheio de lodo. Sorri para ele, mas não me deu atenção. Ainda trôpego, voltei para a pequena cabana onde meus dois companheiros me esperavam para continuarmos a jornada mística que só terminaria quando o céu fizesse sua metamorfose sideral, indo do negrume estrelado para o escarlate da aurora que prenunciava um novo renascer para o mundo. O txana Ibã entoou mais uma canção de nixi pae, chamando de volta a pressão do cipó, enquanto o Tene manuseava calmamente uma folhagem cheirosa que vez ou outra passava em volta da minha cabeça, me enlaçando numa espécie de teia etérea e energética. A “pressão” subiu ao ponto de sentir meus tímpanos tampando. O véu se abriu e os encantos saíram da floresta para nos visitar...